Missa dos Santos Óleos: “Sacerdote: Homem de Esperança”, refletiu Dom Dulcênio
A
Missa dos Santos Óleos, também chamada Missa do Crisma, é uma das celebrações
mais importantes da Igreja Católica. Na Diocese de Campina Grande, a Solenidade
aconteceu na manhã desta quinta-feira, 17, na Catedral de Nossa Senhora da Conceição.
Presidida por Dom Dulcênio Fontes de Matos, Bispo Diocesano, a celebração
reuniu o clero em comunhão com seu pastor, além da participação de diáconos,
religiosos, seminaristas e centenas de fiéis leigos. Esta missa, que ocorre
tradicionalmente durante a Semana Santa, expressa a comunhão da Igreja e
fortalece a unidade entre o bispo e seus sacerdotes.
Durante a celebração, Dom Dulcênio abençoou os
santos óleos — o do Crisma, dos Catecúmenos e dos Enfermos — que serão
utilizados ao longo do ano nos sacramentos administrados nas paróquias. Outro
momento marcante foi a renovação das promessas sacerdotais pelos padres,
reafirmando seu compromisso com o ministério e com o serviço ao povo de Deus.
Esse gesto expressa publicamente a fidelidade à vocação e à missão confiada por
Cristo à Igreja.
Em sua homilia, Dom Dulcênio refletiu sobre o tema
“O Sacerdote: homem de esperança”. Inspirado pelas leituras bíblicas, o Bispo
mostrou que a unção do Espírito é força e missão: assim como Cristo foi enviado
para anunciar libertação, o sacerdote é chamado a ser sinal da presença de Deus
no mundo.
“Neste dia muito especial para toda a Igreja de
Deus, mais especificamente a que está em Campina Grande, como é a Missa
Crismal, em sintonia com o presente Ano Jubilar, desejo refletir sobre como o
sacerdote é chamado a ser homem de esperança. Desta forma, tendo como base a
nossa missão apresentada nesta Liturgia da Palavra, cujas leituras bíblicas
acabamos de ouvir, observamos como Deus nos insere em realidades sempre muito
especiais para que nelas sejamos fanais da virtude da esperança”, iniciou sua
pregação.
O bispo alertou sobre os desafios do tempo atual: o
ativismo, a falta de oração, o consumo excessivo e a busca por conforto podem
esvaziar a missão sacerdotal. O risco de tornar-se apenas um “executivo do
sagrado” ameaça a essência do chamado, que exige entrega, oração e comunhão com
Deus e com o povo.
“No desafio que enfrenta, o sacerdote dos nossos
tempos deve cuidar para não se tornar um “executivo do sagrado”. Diante da
ditadura do tempo, onde somos atarantados por tantos compromissos e cobranças,
a vida acelerada leva-nos à sensação de que o que fazíamos antes, num
determinado período, não dá para fazer agora. E, nisto, pomos desculpas,
inclusive, para não rezarmos bem”, destacou.
Dom Dulcênio também denunciou a perda do senso de
comunidade. O individualismo e a indiferença enfraquecem os laços de fé. O
sacerdote, porém, é chamado a ser sinal de comunhão, alguém que vive a
liberdade interior dada por Deus e que testemunha, com a própria vida, a beleza
de pertencer e servir.
“Quem é o sacerdote em meio a este mundo doente
pela falta de esperança? É aquele que se deixa ser atraído pela gratuidade de
uma vida entregue a Deus. É aquele que cuida dos que lhe foram confiados. É
aquele que sabe os limites e os comunica aos outros. É aquele que não
negligencia a missão, mas também não se deixa sobrecarregar pelos muitos
trabalhos. É aquele que é íntimo de Deus e das dores dos homens. É o homem de
Deus e dos irmãos”, disse.
Por fim, o sacerdote deve ser presença viva da
esperança de Deus. Quando fiel à sua unção, torna-se fonte de consolo e de
bênçãos para o povo. Assim, como Jesus, pode dizer com verdade: “Hoje se
cumpriu esta passagem da Escritura”, tornando-se sinal da aliança eterna entre
Deus e seu povo.
“O sacerdote é o homem da esperança para o hoje
deste mundo, de maneira que, como Jesus, poderá dizer com a autoridade que lhe
foi dada do Alto a respeito da Unção que recebeu: "Hoje se cumpriu esta
passagem da Escritura que acabastes de ouvir" (Lc 4,21). Desta maneira,
fará sentir ao povo as consolações de Deus através de si, ao que a sua presença
será sinônimo de abundância de bênçãos, de aliança perpétua em Cristo com Deus;
será sinal de esperança enfim”, concluiu.
Por: Ascom
Fotos: Ryan Caio (Pascom diocesana)
Confira a homilia na íntegra:
Tanto na Primeira Leitura quanto no Evangelho,
temos a convicção da unção que recai sobre Cristo: “O Espírito do Senhor está
sobre mim, porque ele me consagrou com a unção” (Lc 4,18; Is 61,1). Sabemos que
a unção que recai eternamente sobre o Filho é o Espírito Santo. Por Ele, o Pai
O consagra num movimento eterno de amor. Esta é a realidade trinitária; a
realidade de sempre e para sempre. Porém, no interior da Trindade, o Pai,
origem de toda a missão, envia o Filho com o Espírito Santo que O unge, para
que, também junto a nós, para nossa salvação, o Cristo realize a sua missão.
Devemos dizer, amparados pelo Profeta Isaías, que a
unção do Espírito Santo sobre o Cristo é o “Óleo da Alegria” (cf. Is 61,3a) em
vez da secura da tristeza e da aflição. E nós, ungidos no Ungido, banhados com
o Óleo da Alegria, devemos levar esta mesma Unção para tantos que, na
desesperança, estão empobrecidos, cativos, cegos, desgraçados (cf. Lc 4,
18-19).
Sabemos que o sacerdote é um homem inserido num
contexto sujeito aos desafios e mudanças de cada período. Este momento da
história humana, com certeza, não é o dos mais fáceis. Sabemos ainda que também
temos diante de nós o grande desafio de manter-nos sadios para ajudarmos a
sarar os que doentes ficaram e a preservar da enfermidade os que estão sãos. É
igualmente para isto que a Unção que recebemos serve: para curar e preservar
das enfermidades existenciais a humanidade, levando-lhe o lenitivo da
esperança, que não está no que vemos neste mundo, mas no Céu, naquele Reino que
Jesus nos trouxe, embora a atualidade também deva ser cumulada e tocada pela esperança.
Imaginemos, portanto, o grande desafio do nosso
tempo em que a humanidade deseja independer de Deus; em que a humanidade tende
ao perigo de uma autorreferencialidade. O sacerdote, além da denúncia de que a
nossa sociedade caminha para um secularismo e para a perda do sentido da
transcendência, que faz de Deus esquecido, ou quiçá uma figura mítica, deve
demonstrar com a sua própria vida ungida uma liberdade interior que somente
Deus concede. O sacerdote é um homem livre, porque é cheio de Deus, Autor da
verdadeira liberdade. Com isso, o sacerdote, com a própria vida ungida, deverá
ser testemunha de que, sem a Unção de Deus o homem torna-se só, doente e
amargurado.
Ora, sabemos que, sem a referência divina, a
subjetividade vira uma ditadura do eu: “eu quero assim, eu penso assim…”. Na
acentuação do individualismo, o sujeito vira um mundo à parte do todo. Neste
contexto, a comunidade começa a esfacelar-se, pois o sujeito não se sente
pertença: “eu não sou deste grupo, eu não pertenço a esta comunidade e a
nenhuma outra. Eu me basto!”. A comunidade dá lugar a um processo de
isolamento. Neste contexto, não há empatia, compaixão, o outro não me diz
respeito – “é cada um por si”. E a identidade comunitária de nossa fé? E o
convite de Jesus para integrar uma comunidade? E a vivência do Evangelho? Se a
deterioração da identidade comunitária se apresenta, consequentemente a
deterioração da identidade humana também, pois o homem é um ser para
relacionar-se, a começar pela relação para com Deus, parâmetro de toda e
qualquer outra relação.
No meio desta crise, a identidade do sacerdote, se,
por primeiro, não se firmar em Deus, corre o risco de ficar prejudicada e a sua
missão também. Se o sacerdote, como ministro de Deus que é, não mergulhar na
sua Unção, pode acontecer de adoecer pela desesperança, isolando-se,
desencantando-se com a missão, buscando nos braços das tentações dos prazeres
algo que eles não podem dar; algo que somente Deus tem e pode dar: a nossa
completa satisfação, já a partir deste mundo.
No desafio que enfrenta, o sacerdote dos nossos
tempos deve cuidar para não se tornar um “executivo do sagrado”. Diante da
ditadura do tempo, onde somos atarantados por tantos compromissos e cobranças,
a vida acelerada leva-nos à sensação de que o que fazíamos antes, num
determinado período de tempo, não dá para fazer agora. E, nisto, pomos
desculpas, inclusive, para não rezarmos bem. Quantas vezes, estamos conversando
com pessoas e resolvendo coisas no celular, sem querer nos entregarmos
verdadeiramente ao encontro com o Outro? E, quando comparecemos diante desse
Outro, não o estamos por inteiro.
Outra característica deste tempo, que leva um
coração sacerdotal à secura da desesperança é o consumo, pai de uma série de
desgraças. Nossa sociedade vai apresentando necessidades não existentes para
seduzir o interlocutor a comprar desesperadamente. E, para facilitar a vida da
pessoa, o mercado se desdobra em propagandas mirabolantes. Uma das desgraças é
o “conforto”. É justificável que se tenha coisas para facilitar a vida, mas a
corrida exagerada por isso gerou pessoas frágeis, sem o mínimo de espírito de
resiliência e de resistência. O conforto pode levar-nos a uma proximidade com a
preguiça, ao que os sacerdotes, além dela, correm o risco de também se deixar
levar pelo discurso de consumo, esquecendo-se de reconhecer o caminho do
sacrifício e da renúncia da vontade como aquele de identificação com o Homem
das dores, macerado pelo sofrimento (cf. Is 53,10).
O mundo descartável da desesperança leva ainda a
sociedade a valer-se de um ditame meramente estético, onde os padrões de beleza
dominam as mídias sociais, eivados de pecado e distintos de Deus, fonte de toda
pureza, beleza e bondade.
Quem é o sacerdote em meio a este mundo doente pela
falta de esperança? É aquele que se deixa ser atraído pela gratuidade de uma
vida entregue a Deus. É aquele que cuida dos que lhe foram confiados. É aquele
que sabe os limites e os comunica aos outros. É aquele que não negligencia a
missão, mas também não se deixa sobrecarregar pelos muitos trabalhos. É aquele
que é íntimo de Deus e das dores dos homens. É o homem de Deus e dos irmãos.
O sacerdote é o homem da esperança para o hoje
deste mundo, de maneira que, como Jesus, poderá dizer com a autoridade que lhe
foi dada do Alto a respeito da Unção que recebeu: "Hoje se cumpriu esta
passagem da Escritura que acabastes de ouvir" (Lc 4,21). Desta maneira,
fará sentir ao povo as consolações de Deus através de si, ao que a sua presença
será sinônimo de abundância de bênçãos, de aliança perpétua em Cristo com Deus;
será sinal de esperança enfim.