Por uma renovada Pastoral Social Mística e Comunhão
Por uma
renovada Pastoral Social Mística e Comunhão
“Jesus
disse para o homem da mão seca: Levanta-te! Vem para o meio!” (Mc 3, 3)
“Evangelizar é tornar o Reino de Deus presente no mundo”
(Papa Francisco - Evangelii Gaudium, 176)
Falar da pastoral social é falar da
dimensão social do evangelho, a dimensão integrativa de toda ação
evangelizadora da Igreja, é falar das consequências do mandato evangélico de
amar a Deus e ao Próximo, ou seja, da vivência cristã no mundo. É o seguimento
ao Cristo Pobre, Crucificado e Ressuscitado na construção de uma sociedade
fraterna e sem exclusões.
A mística do/a agente de pastoral social
é a do seguimento do Cristo Pobre, Crucificado e Ressuscitado, assim como testemunhou São Francisco e Santa
Clara de Assis, São Óscar Romero, Santa Dulce dos Pobres, Margarida Maria
Alves, Padre Ibiapina e tantos outros/as discípulos/as missionários/as que
mergulharam no encontro com os pobres, com os excluídos/as, com as dores deste
mundo, mundo criado por Deus que é amor e nos convida a recriar, reconciliar, a
sermos instrumentos de paz e do diálogo a serviço do Reino. Mística alimentada
no dia a dia por uma vivência orante, contemplativa da palavra de Deus e da
realidade, uma vivência que requer abertura. autocrítica, conversão,
disponibilidade missionária e profética que nos faz ser sal da terra e luz no
mundo testemunhando a Fé Pascal. Nossa páscoa na páscoa de Jesus, como nos
ensinou Dom Pedro Casalda?iga.
O/a agente de pastoral social é
chamado/a a testemunhar a vivência da páscoa, essa conexão com todo o mistério
pascal e trinitário que nos faz comunidade e nos insere no mundo com todas as
suas contradições na perspectiva de uma igreja em saída, de sermos instrumentos
da paz e da justiça.
Uma vida de oração, encontro pessoal com
um Deus que é uno e trino, que é comunidade e que se encarnou na realidade
humana, assumindo todos os nossos sofrimentos e esperanças, nos faz agentes de
pastoral social profundamente místicos, agentes de pastoral que dedicam suas
vidas nas mais variadas áreas de exclusão e desigualdade social e
ambiental, na luta por direitos, na luta pela Terra, pelo Teto e pelo Trabalho
- os três Ts do Papa Francisco, na luta
pela realização da dignidade humana, essa missão nos pede um abandono total nas
mãos do Pai. Quanto mais serviço, mas deve ser o nosso abandono nas mãos de
Deus, de um Deus que é mãe, como disse o Papa João Paulo I.
Nos mestres da meditação cristã, encontramos:
“Jesus uniu a sua atitude de oração interior total e
sua longa atividade de oração com uma vida pública sem descanso. E a tradição
mostrou, muito ao contrário de algumas afirmações superficiais, que a maior
atividade social exige personalidades fortes, fortemente unificadas e capazes
de renovarem constantemente as suas energias interiores. A maior intensidade de
trabalho exige um profundo recolhimento interior e uma atitude de oração
permanente.” (conf. Meditação Cristã, John Main)
Quanto maior a vida pública de militância, de engajamento
pastoral, maior deve ser a nossa vida interior, uma vida conectada com Deus e
por causa dele e com ele a vida pública, pastoral e militante acontece no engajamento
da opção preferencial pelos pobres, denunciando as injustiças e suas causas e
colaborando no espaço público e da política; na construção de políticas
públicas, na organização do povo para lutar por seus direitos, na promoção de
ações, campanhas solidárias para socorrer aos que passam fome e marginalizados
de toda sorte, no cuidado com a nossa Casa Comum, que se desdobra em políticas
sociais e econômicas que tenham a integridade da criação - a ecologia integral
e a plena realização dos direitos humanos, assim como nos aponta o Papa Francisco
na sua Carta Encíclica Laudato Si, como objetivos centrais.
O Papa Francisco refletindo o sermão das
bem-aventuranças na sua Exortação Apostólica sobre a Santidade Gaudete et
Exsultate no seu número 79 nos mostra como a dimensão sociotransformadora é
parte constitutiva de toda ação evangélica e evangelizadora da Igreja:
“Esta justiça começa a se tornar realidade na vida de
cada um quando se é justo nas próprias decisões, e depois manifesta-se na busca
da justiça para os pobres e vulneráveis. É verdade que a palavra “justiça” pode
ser sinônimo de fidelidade à vontade de Deus com toda a nossa vida, mas, se lhe
dermos um sentido muito geral, nos esquecemos de que se manifesta especialmente
na justiça com os inermes: “Aprendei a fazer o bem, buscai o que é correto,
defendei o direito do oprimido, fazei justiça para o órfão, defendei a causa da
viúva. (Is 1,17).”
Aqui podemos afirmar que o trabalho pela
justiça social e ambiental, é um desdobramento do seguimento a Jesus Cristo e a
sua palavra no encontro com as várias realidades deste mundo, assim como no
Êxodo, Deus escuta, vê, conhece o sofrimento do seu povo, desce ao seu encontro
e envia. Também nos deparamos com essa experiência nas pastorais sociais
específicas, aquelas que estão junto com os/as trabalhadores/as sem terra, na
luta por uma agricultura familiar e agroecológica, com os sem teto, nas
mobilizações pelo direito à moradia digna, na organização dos/as
trabalhadores/as, nas organizações da economia solidária, com os/as
desempregados/as, com os encarcerados, que estão nas prisões, com os moradores
em situação de rua, na acolhida aos imigrantes e refugiados/as, na acolhida aos
dependentes químicos e alcoólatras, na defesa
das crianças e idosos/as, nas favelas e periferias, com as juventudes,
na pastoral da saúde lutando por uma saúde de qualidade para todos/as, nas
visitas aos hospitais e aos doentes, na organização dos/as pescadores/as, junto
a pastoral da mulher marginalizada, na defesa dos povos originários e
quilombolas, na luta contra o racismo e as discriminações, na formação de lideranças através das escolas
de fé, política e cidadania e outros espaços formativos, na defesa da ética na
política, na convivência ecumênica e na promoção do diálogo inter-religioso,
nas iniciativas da Cáritas e outros organismos de promoção humana, enfim, em
tantas outras áreas que a realidade vai clamando que a presença da pastoral
social se faça acontecer de forma profética, missionária e solidária.
É injusta a acusação de que as pastorais
sociais, não rezam, não evangelizam, aqui reconheço que em algumas situações
alguns e algumas agentes de pastoral tenham perdido a razão evangélica do seu
trabalho, assim como também encontramos em alguns grupos uma defesa da
"espiritualidade" mas uma espiritualidade totalmente descomprometida
com a dimensão social do evangelho. Mas não se pode julgar o todo, por algumas
situações. Sim, as pastorais sociais e nós, seus/suas agentes, com nossas
virtudes e falhas, erros e acertos no cotidiano de nossa missão, procuramos
viver essa mística como comprometimento ao seguimento do Cristo Pobre,
Crucificado e Ressuscitado, mística profundamente pascal, na condição de
batizado e batizada em comunhão com a sua Igreja Povo de Deus, comprometidos/as
com toda a renovação conciliar do Vaticano II, reforçada pelas conferências do
episcopado latinoamericano e pela doutrina social da igreja.
Por fim e sem conclusão, porque há muito
por dizer e por fazer para uma renovação da pastoral social, uma conversão
pastoral que deve ser permanente, como nos pede a conferência de Aparecida,
aqui quis refletir sobre a vivência da mística como princípio para qualquer
renovação e para o trabalho pastoral, missionário e solidário no dia a dia da
missão. Sugiro algumas experiências para o aprofundamento dessa mística, tanto
de uma forma pessoal, como comunitária: a eucaristia como fonte, ápice e
partilha, como também a leitura orante da palavra de Deus, do exame de
consciência, a meditação cristã que nos leva ao cuidado do corpo e da mente de
forma diária, a meditação como forma de
rezar sem dizer nada, simplesmente ficarmos na presença de Deus, os exercícios
físicos, o silêncio como a expressão mais íntima de abandono e a prática do
Ofício Divino das Comunidades de forma pessoal e comunitária. Reserve sempre um
momento de cada dia para essas práticas que nos ajudam a ter uma vida interior
plena de intimidade com Deus e com o seu povo.
“Mais que comum dos dias, olhei o mais que pude os
rostos dos pobres, gastos pela fome, esmagados pelas humilhações, e neles
descobri teu rosto, Cristo Ressuscitado!” (Dom Helder Câmara).
Roberto Jefferson Normando
Formação em Filosofia
Membro da Coordenação da Comissão Diocesana de Pastoral para a as Pastorais
Sociais da Diocese de Campina Grande-PB
Membro da Rede de Assessores do Centro Nacional de Fé e Política “Dom Helder
Câmara - CEFEP/CNBB
Membro da Economia de Francisco e Clara - ABEFC