A luz da fé em Cristo

Postado em 03/02/20 às 10:495 minutos de leitura381 views
Há 40 dias celebrávamos o Natal do Senhor e hoje a sua luz volta a ser posta em relevo. A festa da Apresentação do Senhor encerra o ciclo dos mistérios da infância de Jesus. Dentro de poucos dias, 25 de Março, solenidade da Anunciação, voltaremos a esperar mais uma vez o Natal do Senhor. No Oriente cristão é a “festa do encontro” do Senhor com o seu povo, celebrada desde cedo pela Igreja e que se estendeu pelo mundo como a “festa da luz”, por isso, na liturgia, está prevista uma procissão com velas acesas: é o povo de Deus que vai ao encontro do Senhor, “luz das nações”. O verdadeiro “Sol da Justiça”, “cujos raios dão vida ao mundo”, na expressão de Clemente de Alexandria (150 - 215). No Antigo Testamento o povo eleito aguardava com ansiedade a vinda do Messias Salvador, anunciada pelos profetas. Porém, a sua chegada não será como profetizou Malaquias, (cf. Ml 3,1-14) um dia tremendo em que o Senhor entraria no Templo, aterrorizando a todos, em toda a sua glória, poder e majestade, purificando a humanidade e o mundo: “Ele é como o fogo da forja e como a barrela dos lavadeiros...” (v.3) Ao contrário, entra no Templo uma frágil e indefesa criança, nos braços de seus pais. São Lucas (cf. Lc 2,22-40) narra no episódio da “apresentação do Menino Jesus ao templo”, como seus pais cumprem o que marcava a lei judaica: todos os primogênitos seriam oferecidos ao Senhor (cf. Ex 13,1-16). No entanto, como as crianças não podiam ser sacrificadas era preciso resgatá-las; os pais levavam aos sacerdotes do Templo, um animal puro para que fosse imolado no lugar do filho primogênito. José e Maria oferecem por seu Filho a oferenda dos pobres: “um par de rolinhas ou dois pombinhos.” No Templo se dá na ocasião o encontro de Simeão e Ana com o Menino Jesus; duas pessoas idosas, simples, apenas piedosas e totalmente abertas à ação de Deus. Esse encontro é símbolo de uma realidade muito maior; o encontro da humanidade com Deus, “luz das nações” (v.32). Simeão e Ana representam o povo de Israel e a sua longa espera da vinda do Messias. O relato de Lucas é desconcertante. Quando os pais se aproximam do Templo com a criança nos braços, não saem ao seu encontro os sumos sacerdotes nem os lideres religiosos. Dentro de uns anos eles serão aqueles que o entregarão para ser crucificado. Tampouco vêm a recebê-lo os mestres da Lei que pregam nos átrios daquele Templo. Anos mais tarde rejeitarão Jesus por acharem que ele viola a Lei do sábado. Quem acolhe Jesus e o reconhece como o Enviado de Deus são dois anciãos de fé simples, que viveram as suas longas vidas esperando a salvação de Deus. Eles representam tantas pessoas de fé simples que, em todos os povos de todos os tempos, vivem com a sua confiança colocada em Deus. São pessoas que têm apenas sua fé em Deus, só esperam de Deus “a consolação”, a “libertação”, “a luz” que ilumine as trevas em que vivem os povos da terra. Esta fé dos simples é a fé que Deus não tem problema nenhum em entender e acolher. Simeão e Ana representam a fé dos antigos pais e mães do Povo de Deus e de profetas que haviam vivido a esperança do Messias, e assim estes anciãos nos fazem pensar na longa sucessão de nossos antepassados, através dos quais a luz de Deus chegou até nós. Nossos pais, avós e os pais dos avós. Sem eles ou talvez, não por linha direta, mas por outros ramos da família passou até nós a luz, a chama da fé às nossas mãos e sem esse testemunho jamais seríamos nós cristãos. Diante de Jesus Cristo ninguém pode ficar indiferente. O encontro com Ele provoca um posicionamento, obriga a tomar a decisão de optar por segui-lo. Hoje Jesus nos oferece sua luz; ao tomá-la decidamos iluminar nossa vida. Optemos pelo caminho que leva à luz e rejeitemos as sombras da intolerância, da injustiça e da morte. Na Carta Encíclica “Lumen Fidei” sobre a fé, do Papa Francisco, ele fala que a fé transmite-se primeiramente pelo Batismo, mas também “transmite-se por assim dizer sob a forma de contato, de pessoa a pessoa, como uma chama se acende noutra chama. [...] A pessoa vive sempre em relação e é impossível crer sozinhos. A fé não é uma opção individual que se realiza na interioridade do crente, não é uma relação isolada entre o ‘eu’ do fiel e o ‘Tu’ divino, mas por natureza, abre-se ao ‘nós’. A fé chega até nós na memória de outros, das testemunhas, guardado vivo naquele sujeito único de memória que é a Igreja; esta é a Mãe que nos ensina a falar a linguagem da fé”. (LF. 38-39) Portanto, a transmissão da fé é sempre uma tarefa da comunidade cristã. Talvez seja a luz o elemento físico que mais nos ajuda a compreender Deus. A expressão luz da fé é da tradição da Igreja para designar o grande dom trazido por Jesus. A fé enquanto encontro com o Deus vivo que se manifestou em Cristo é luz: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida.” (Jo 8,12) Cristo e o seu Evangelho são luz, e esta necessariamente há de iluminar a existência daquele que crê sinceramente; e não só a sua existência, mas também a dos outros: “Vós sois luz do mundo.” (Mt 5,14) O cristão é luz, e o mundo necessita dessa luz. A fé é a lâmpada acesa desde o nosso batismo, para iluminar toda a nossa vida; critérios, valores e conduta devem estar conformes com essa luz de Cristo que nos iluminou. Luz que nos foi dada não para guardar no baú das recordações, mas para que ilumine os outros. O que fizemos da nossa luz? O que aconteceu com aquela vela acesa que em nosso batismo recebemos? Examinemo-nos se por medo ou covardia, oportunismo ou conveniência, andamos ocultando a luz da fé em Cristo, pois diante dessa luz nada pode ficar indiferente. Jesus é a luz que põe cada coisa em seu lugar, em sua verdadeira realidade e por isso as trevas não a receberam. Missão da Igreja e do cristão é saber apresentar Cristo aos homens e mulheres e ser testemunhas da luz que Ele é para iluminar quantos caminham nas trevas e nas sombras da morte.

Padre Assis Pereira Soares – Pároco da Paróquia do Sagrado Coração de Jesus.

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