O aborto e o perdão:  Pe. Assis concede entrevista e explica a decisão do Papa para o Ano da Misericórdia

Atualizado em 25/06/19 às 12:504 minutos de leitura360 views

A Igreja é  favor da vida em toda e qualquer circunstância. O aborto, como já disse o papa Francisco na sua exortação apostólica, Evangelii Gaudium, (Alegria do Evangelho), é um atentado contra a própria humanidade: “a defesa da vida por nascer está intimamente ligada à defesa de qualquer direito humano”. Porém a Igreja já concedia o perdão àqueles que, de coração, se arrependeram de terem provocado o aborto. O que muda, então, com a determinação do Papa para o ano Jubilar da Misericórdia, que terá início no dia 8 de dezembro, e irá até o dia 20 de novembro de 2016?

O Vigário Geral da Diocese de Campina Grande,  Pároco do Santuário do Sagrado Coração de Jesus, Pe. Assis Pereira Soares, explica esta mudança em entrevista concedida à Pascom.

Pascom - Padre, o mundo se surpreendeu com a declaração do Papa Francisco, determinando que, no Ano da Misericórdia, os sacerdotes absolvam do pecado aqueles que buscaram este caminho. Mas ficou a impressão de que as pessoas desconheciam que este perdão já era concedido através do Sacramento da Confissão.

Pe. Assis - Exatamente. O próprio Papa Francisco disse que não existe pecado que Deus não perdoe. A Igreja sempre exerceu este poder de reconciliação e de perdão. Ela deve ser este instrumento. Por ocasião de um Ano Santo, como este Ano da Misericórdia, é uma oportunidade de uma anistia geral, uma anistia para todos os pecadores. O que o Papa fez foi estender este perdão, que era concedido apenas pelos bispos, através do sacramento a confissão,  a todos os sacerdotes. Mas esta prática aqui na diocese já existe: o nosso bispo já havia, ano passado, estendido esta faculdade de perdoar do pecado do aborto a todos os Párocos.  Eles, analisando a situação e atendendo em confissão, concedem este perdão, porque assim, a gente agiliza essa intermediação do perdão nesses casos.

Pascom - O Papa também fala da compreensão que todos precisam ter para com as mulheres que acabaram enxergando no aborto a única saída para seus dilemas. Mas isso não quer dizer que a Igreja passará a aceitar o aborto, certo?

Pe. Assis - Não, o aborto continua sendo pecado: “Não matar”. O belíssimo documento do Papa João Paulo II , “O Evangelho da vida”, dedica boa parte à questão do drama do aborto. Ele continua sendo um atentado à vida, mas nós conhecemos, por outro lado, o drama das mulheres e de todos que procuraram o aborto. Aliás, é bom lembrar que não é só a mulher a responsabilizada por este pecado. Todos aqueles que incentivam ou realizam o ato do aborto, estão no mesmo pecado contra a vida. Não é só a mulher a ser responsabilizada. Quanto a isso não mudou nada. O que o Papa quer é que nós, como pastores, conheçamos o drama do aborto vivido por algumas pessoas e procuremos compreender as razões que levaram estas pessoas a praticarem o aborto, consciente ou inconscientemente. Às vezes nem há uma consciência moral do ato, e estas pessoas vivem um drama enorme, pois o aborto deixa marcas e cicatrizes na vida de toda pessoa que concorreu para esta situação, mas sobretudo na vida da mulher. Ela fica marcada para o resto da vida e nós bem conhecemos estes dramas. O que o Papa quer, é que nós sejamos instrumentos deste acolhimento, dessa compreensão do drama existencial ou moral da pessoa que está arrependida, acolhamos este pedido de perdão e concedamos o perdão a esta criatura, para que ela possa recomeçar a sua caminhada de vida um pouco curada desta ferida.

Pascom - Já que estamos falando em pecado e confissão, é bom reforçar que Só Deus perdoa os pecados. Mas o Padre, mesmo sendo um homem sujeito às fraquezas como outros homens, está ali em nome de Deus e da Igreja para absolver os pecados.

Pe. Assis - Deus é quem perdoa e o encontro através do sacramento da confissão é um encontro com Deus, com o perdão, com a misericórdia. O próprio Jesus dá este poder à Igreja: “os pecados que vocês perdoarem, serão perdoados, os pecados que vocês não perdoarem, não serão perdoados”. A Igreja tem o poder desta reconciliação, concedido pelo próprio Jesus, à disposição de todos que reconhecem o pecado, que estão sinceramente arrependidos e dispostos a uma nova atitude de vida. A questão se trata deste ponto: as pessoas que nos procuram, que tem consciência do pecado, são pessoas Cristãs, que querem o  encontro com a misericórdia e com o amor de Deus, que estão sinceramente arrependidas, a todas elas a Igreja deve lhes oferecer o perdão. Não deve ser negado a ninguém. Agora, o que nós padres precisamos, já que vamos ser instrumentos de perdão também na questão do aborto, é sermos capazes de compreender as razões que levaram a pessoa a cometer tal delito, depois ajudar essa pessoa no caminho penitencial, de conversão autêntica e conduzir esta pessoa em decisões que vão ajudar a reparar este erro. Talvez, o “eu te perdoo deste pecado”, dita àquele que pecou, seja menos importante do que o “de agora em diante”, o “como vou viver com esta realidade”. Queremos que estas pessoas sejam também instrumentos para que outras pessoas não caiam no mesmo pecado, no mesmo erro.

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